A falência de uma empresa é uma bola de neve. As 4594 empresas que em 2014 deram início a um processo de insolvência tinham, ao longo dos dois anos anteriores, despedido 25 mil pessoas e reduzido em 365 milhões de euros os gastos com salários. É uma queda de 73% no valor total das remunerações pagas entre 2011 e 2013, com efeitos que se espalharam no resto da economia.
O número consta de um estudo facultado ao PÚBLICO pelo Instituto Informador Comercial, uma consultora de gestão de crédito, e ilustra apenas uma das muitas ondas de choque que surgem quando um negócio começa a derrapar. Uma insolvência, bem como os anos que a precedem, afecta o rendimento das famílias dos funcionários, fornecedores, serviços contratados, consumo de combustíveis e ainda as empresas e serviços a que recorrem os que são directamente prejudicados. Os cofres do Estado, por seu lado, sentem o impacto da quebra de receitas fiscais.
Não há dados sobre o número de pessoas que conseguiram encontrar outro trabalho que depois de perderem o emprego nas empresas que acabariam por pedir insolvência. Mas o período analisado, marcado pelo empréstimo internacional e pelo encolher da economia portuguesa, caracteriza-se por níveis de desemprego historicamente elevados. Em 2011, a taxa de desemprego foi de 12,7%. Subiu para 15,5% em 2012 e atingiu um pico de 16,2% em 2013. Um ano depois, desceu para 13,9%, de acordo com o Instituto Nacional de Estatística.
Outro dos fenómenos documentado pelos números é a quebra nas encomendas. Aquelas 4594 empresas tinham reduzido em 1409 milhões de euros as compras aos respectivos fornecedores (importações incluídas) anos antes de decidirem avançar com a insolvência. É um valor que significa menos 75% de compras, quando se compara a actividade de 2011 com a de 2013.
"Todas as empresas que sobreviveram a este período negativo abanaram", observa Josué Mateus, director do Instituto Informador Comercial. "Quando uma base de clientes sofre uma quebra, automaticamente as empresas fornecedoras sentem. É um efeito dominó". Josué Mateus acrescenta que o relatório pretende apenas compilar dados estatísticos, sem avançar explicações para os diferentes fenómenos observados. Já o estudo refere que muitas das empresas que têm relações comerciais com as firmas que acabam por seguir para insolvência “chegam a passar por dificuldades económicas e financeiras", correndo algumas delas o risco de ter um desfecho semelhante.
Facturação caiu 82%
O volume de negócio das empresas analisadas encolheu dois mil milhões de euros entre 2011 e 2013, uma quebra de 82%. "Em termos de impactos fiscais e em valores médios, esta perda representa cerca de 467 milhões de euros que o Estado deixou de receber em sede de IVA", observa o estudo.
Tal como acontece com as despesas e com as remunerações, a descida anual de facturação acentua-se em 2013, o ano imediatamente anterior ao do início do processo de insolvência. O volume de negócios total das empresas analisadas caiu 69% em 2013 face a 2012, quando tinha descido 40%. Os gastos com salários afundaram 61% em 2013, após uma queda de 30% em 2012. Por fim, as compras aos fornecedores, recuaram 69% após uma descida anterior de 40%.
Os dados mostram ainda repercussões de menor monta. Os cortes nos consumos de serviços como electricidade e água significaram uma redução de 94 milhões de euros entre 2011 e 2013 para os fornecedores. As despesas com combustível recuaram 67 milhões, os investimentos em publicidade e propaganda caíram 17 milhões, e os gastos com seguros desceram quase dez milhões de euros.
O ano passado está longe de ser o pior no que diz respeito a insolvências: foi o segundo consecutivo em que se registou uma redução no número de empresas que seguiram por esta via. A maioria era da área do comércio e da reparação de automóveis – foram 1345 neste sector, correspondentes a 29% do total. Segue-se o sector da construção, com 931 empresas, um quinto de todas insolvências. Em terceiro lugar surge a indústria transformadora: 713 empresas, ou 16% do total.
Porém, uma análise mais fina das áreas de actuação das empresas, que desagrega aqueles grandes sectores com base no código de actividade das firmas usado pelas Finanças, mostra um cenário diferente. A actividade mais representativa, com 11% do total, é a da construção de edifícios, seguindo-se os transportes rodoviários de mercadorias, com 4%.
Os concelhos com mais empresas insolventes são também os mais populosos: Lisboa, Porto, Sintra e Vila Nova de Gaia.
De acordo com o Código da Insolvência e Recuperação de Empresas quando uma empresa é declarada insolvente não tem possibilidade de cumprir com as “obrigações vencidas”. Significa que não paga a fornecedores, bancos, accionistas e empregados.
FONTE: Jornal Público (14/09/2015)