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REFLEXÕES SOBRE O PROCESSO ESPECIAL DE REVITALIZAÇÃO (PER) - DR.ª LILIANA I. MARTINS
Desde meados de 2012 que as famílias portuguesas podem lançar mão de um mecanismo legal, designado por Plano Especial de Revitalização (PER), de forma a renegociarem todas as suas dívidas em simultâneo com cunho dos tribunais portugueses e, assim, evitarem processos executivos e/ou uma possível insolvência.

Naturalmente que, para os devedores, este mecanismo é o milagre da estabilidade familiar das famílias endividadas, uma vez que sentem que poderão recuperar o seu bom nome, voltar a cumprir com os seus credores, evitarem penhoras dos seus ordenados e manterem as suas casas.

No entanto, o PER não pode ser um produto de venda de “supermercado” a consumir por todos, sem qualquer estudo prévio da sua viabilidade. Se é verdade que já foram aprovados milhares de PER por todo o país, o certo é que, infelizmente, milhares deles estão agora a mostrar-se inúteis.

A verdadeira intenção do PER é a de viabilizar a longo prazo aquele devedor que quer cumprir com as suas obrigações e tem de sobreviver dignamente com o restante do seu vencimento. Acontece que este exercício do pagamento aos credores e a garantia das despesas mais básicas com o seu agregado familiar não são vistos de forma séria na negociação com a banca, acabando por estrangular novamente aquele devedor com as novas prestações mensais.

Ora, a consequência não poderia ser outra que não o novo incumprimento dos pagamentos aos credores. Isto acontece porque, na maioria das vezes, os PER não são vistos à luz das necessidades de cada agregado familiar mas antes como um produto fácil.

Naturalmente que a vida económica destas famílias não é, nem podia ser, igual em todos os meses, enquanto as novas prestações que resultam do acordo no PER são mensalmente no mesmo valor, não permitindo atrasos ou novos incumprimentos ou desculpas para fugir ao pagamento.

A intenção do recurso ao PER à força, sem se tomarem em consideração outros elementos faz com que todos os rendimentos auferidos sejam praticamente consumidos para as prestações aos credores… Mas… e como comem os devedores? Que roupas vestem? Que energia lhes conserva os alimentos?

Nos PER versão “produtos-de-supermercado”, apenas se tomam em consideração os rendimentos mensais líquidos e as novas prestações mensais a pagar aos credores – assim, puro e duro… E seguem então, chapa 5, cópias dos mesmos planos prestacionais para milhares de famílias.

E milhares de famílias estão a pagar à banca, todas com as mesmas condições, com os mesmos prazos e juros mas com despesas diferentes e rendimentos incomparáveis.

O PER pode ser viável para aqueles que querem dele fazer mão a longo prazo, e que termine com a liquidação de todos os valores em dívida, libertando o devedor daquele encargo, agora cumpridor.

O que se quer evitar e camuflar com os PER “produtos-de-supermercado” são famílias claramente insolventes e que tudo tentam fazer para não perderem as suas casas. Mas, por este andar, perderão as suas casas e perderão vários meses das suas vidas com gastos inúteis, como tem vindo a acontecer com inúmeras famílias que recorreram a este produto.

Com isto não fazemos uma crítica cerrada à credibilidade e função do PER, antes pelo contrário (defendemos a ponderação deste instituto e lançar mão a este quando o devedor realmente possa beneficiar e tirar dele a solução necessária), mas sim uma crítica e uma chamada de atenção aos PER que são “vendidos” sem se ponderar a sua durabilidade e a necessidade de cada família, sem se estudar o que o devedor pode oferecer e o que o credor pretende obter, caso a caso, fugindo assim a um qualquer Ícaro que quer conhecer o sol mas derrete ao lá chegar.

Liliana I. Martins
Advogada na Globalawyers