As propostas de alteração ao regime do fundo de garantia salarial (FGS) enviadas esta terça-feira pelo Governo aos parceiros sociais continuam a deixar de fora os trabalhadores que mantêm o vínculo às empresas insolventes com planos de recuperação aprovados.
O secretário de Estado da Segurança Social, Agostinho Branquinho, aceitou muitas das propostas dos parceiros sociais para resolver a situação dos 6700 trabalhadores que nos últimos anos têm visto os seus pedidos de apoio ao FGS serem recusados. Contudo, continua a haver problemas por resolver e que serão abordados na reunião do conselho de gestão do fundo, marcada para esta quarta-feira à tarde.
O FGS passa a abranger os trabalhadores de empresas em processo especial de revitalização (PER), incluindo os que viram os seus requerimentos recusados e que, agora, “deverão ser objecto de reapreciação oficiosa” pelos serviços. Ao contrário do que tinha sido dito pelo secretário de Estado na concertação social, não há qualquer prazo, pelo que todos os processos recusados serão reapreciados e poderão beneficiar do fundo.
Também os trabalhadores de empresas declaradas insolventes com planos de insolvência aprovados serão abrangidos pelo FGS. Mas, neste caso, a aplicação do novo regime aos processos já recusados fica sujeita a algumas restrições. Desde logo, só serão abrangidos os requerimentos apresentados “nos 12 meses anteriores à data da entrada em vigor” do novo regulamento do fundo e, adicionalmente, só serão contemplados os trabalhadores que viram os seus contratos cessar e não têm qualquer vínculo com a empresa em processo de viabilização.
Para o representante da CGTP no FGS, Augusto Praça, a exclusão dos trabalhadores “não faz sentido” e “prejudica os que mantêm o vínculo à empresa e têm salários em atraso”. E lembra que se a proposta for por diante, poderá pôr em causa a viabilização das empresas, porque os trabalhadores tenderão a fazer cessar os contratos.
Rui Murta, administrador de insolvência, tem em mãos dois casos que não serão resolvidos com os ajustes feitos ao FGS. Por um lado, uma parte dos 200 trabalhadores e ex-funcionários da Pluricoop (a maior cooperativa de consumo do país que foi declarada insolvente em 2011 e que está a tentar a recuperação), não terá acesso ao fundo, visto que os requerimentos foram apresentados há mais de 12 meses. Mas existe ainda outro processo, o da cooperativa de consumo de Faro Coopofa, em que passará a haver um duplo tratamento na sequência das novas regras. Neste caso, há trabalhadores que já cessaram os contratos de trabalho (e, portanto, estão abrangidos) e outros que continuam vinculados à insolvente, cujo plano de recuperação foi aprovado pelos credores.
O administrador de insolvência teme, no entanto, que a aprovação destes planos fique em xeque com as alterações ao regulamento. “Os trabalhadores vão sentir-se tentados a recusar os planos porque sabem que se estiverem ligados à empresa não recebem” os créditos devidos através do FGS.
Rui Murta alerta que esta situação é “preocupante”, tendo em conta que os funcionários têm “um peso determinante” quando é necessário decidir entre a liquidação e a recuperação de uma empresa, pelo volume de dívidas que lhes está associado.
O FGS foi criado para fazer face às necessidades imediatas dos trabalhadores quando as empresas estão em dificuldades ou insolventes, mas o seu regulamento ainda não tinha sido adaptado aos novos mecanismos de viabilização de empresas. Isso levava os serviços de Segurança Social a recusar os pedidos dos trabalhadores de empresas que iniciaram PER ou que, tendo sido declaradas insolventes, tentaram a recuperação. Na prática, o fundo só estava a dar resposta a empresas insolventes que acabaram por ser liquidadas ou as que iniciaram processo extra-judicial de viabilização ao abrigo das antigas regras.
FONTE: Público (07/10/2014)